ENTREVISTA COM O ESCRITOR ALEXANDRE BRANDÃO



1 - Fale de você: onde nasceu? qual  formação? onde vive? o que faz?

Sou Alexandre Brandão, 60 anos, mineiro de Passos. Me mudei para o Rio de Janeiro há 42 anos, mas, entre 1985 e 1987, vivi em São Paulo. Sou economista de formação e funcionário público federal (IBGE).

2 - Quais são os seus escritores preferidos? Por quê?

Seria uma lista imensa, pois ler é uma tarefa que me agrada muito. De todo modo, cito alguns autores cuja leitura me fez refletir bastante sobre a própria escrita: Machado de Assis, Ernesto Sábato, João Gilberto Noll, Clarice Lispector, Philip Roth, Virgínia Woolf e Gertrude Stein. Incluindo poetas: Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles e a polonesa Wisława Szymborska.

3 - Como é o seu cotidiano?

Desde que teve início a pandemia, trabalho à distância, assim, durante oito horas do dia estou à frente do computador cuidando das tarefas laborais. É verdade que, em casa, é possível flexibilizar as oito horas, ou seja, às vezes estou trabalhando à noite e, durante a tarde, lidando com a literatura. A verdade é que, recolhido, tenho escrito novos textos e organizado antigos. Assim, venho montando livros de contos, crônicas e poesia.

4 - Quantos livros publicou?

Além de participar em algumas antologias, oito livros. Cinco de contos – Contos de homem, 1996; Estão todos aqui, 2005; A câmera e a pena, 2009; Qual é, solidão?, 2014; e Uns e outros mais dois ou três, 2017 —, dois de crônicas — No Osso: crônicas selecionadas (2012); O bichano experimental, 2015 —, e um de poesia — Nenhuma poesia: uma antologia (2020). Meus três livros mais recentes foram lançados pela editora Patuá.

5 - Quais foram as suas alegrias literárias?

Elas estão ligadas a reações de leitores, seja um e-mail que recebo ou uma postagem em rede social que faz referência a algum de meus livros ou alguma crônica, poesia. Mas também gosto muito dos diálogos que se desenvolvem na preparação dos livros, por exemplo, com quem escreve a orelha ou o prefácio, e, mesmo antes, quando peço que algum leitor leia o material e faça apontamentos, críticas. Enfim, a literatura me agrada quando promove interações.

6- Quais foram as suas frustrações literárias?

A maior frustração está ligada à mudança do mercado. Hoje há uma profusão de pequenas editoras, o que é ótimo (todos os meus livros saíram por essas editoras), mas, por outro lado, seus livros dificilmente estão nas livrarias. As livrarias, por sua vez, lutam bravamente para resistir à concorrência das gigantes virtuais. Em paralelo, o Brasil tem feito pouco em termos de política pública de estímulo à leitura, e o pouco já feito vem sendo atacado por esse governo extremista e incompetente.

7 - Qual é o seu objetivo na literatura?

Dialogar com o meu tempo.

8 - Você julga a escrita superior à oralidade? Por quê?

São duas coisas distintas, e a literatura não pode se virar contra a oralidade. Tampouco pode ser oralidade pura. Digo isso, mas, claro, chamo a atenção para os casos que ferem uma coisa (bons livros beletristas) ou outra (bons livros mergulhados na oralidade). A literatura, eu acho, vive em permanente atrito com a oralidade. E a boa literatura sabe tirar proveito disso.

9 - Como você se organiza para escrever?

Não me organizando. Escrevo quando possível, sem regras. Por ter um emprego formal, a literatura fura os espaços e aguarda a hora. Por isso, meus livros são organização de material acumulado, um olhar em busca de unidades possíveis. Na pandemia, pela primeira vez, venho planejando livros, ou seja, escrevendo com um projeto pré-concebido. No caso, dois livros de contos, um deles de minicontos.

10 - Você quer ser reconhecido? Por quê?

Reconhecido? No sentido da fama, não. No sentido de ter leitores, sim. A razão é que, como penso na literatura como diálogo, não quero ficar falando sozinho por aí. Podem achar que sou louco, o que não é totalmente verdade.

11 - O que é um poeta ou um escritor?

Uma máquina de perguntas. Se é bom, é uma máquina de perguntas bem-feitas.

12 - Todo escritor é vaidoso?

Acho que sim. E se a vaidade não for doentia, tudo bem, pois é um dos lados do amor-próprio.  

13 - Como você lida com o fracasso?

Dormindo e acordando todos os dias.

14 - Como você lida com o sucesso?

Acordando e dormindo todos os dias. Com cerveja e boas risadas entre uma coisa e outra.

15 - Qual é o autor contemporâneo que, de fato, você admira? Seja sincero (a).

A questão exige que eu conheça tudo de um autor. Só assim, eu poderia falar em admiração pela obra. Nesse sentido, não conheço a obra inteira de ninguém. Machado, Graciliano, Noll, Roth, Lispector são autores de quem li muita coisa, mas não tudo. Por outro lado, a admiração pode ser pela pessoa pública do autor. Aí há muitos. Porém, há obras contemporâneas que, a meu ver, chegaram para ficar na história da literatura: Um defeito de cor, Ana Maria Gonçalves; O corpo interminável, Cláudia Lage; Marrom e Amarelo, Paulo Scott; Carta à Rainha Louca, Maria Valéria Rezende. Para não ficar apenas entre brasileiros: As doenças do Brasil, Valter Hugo Mãe. Esses são livros que li nos últimos cinco anos e que, a meu juízo, sobreviverão a todas as futuras hecatombes do mundo literário. E para não deixar a poesia de lado, e sem citar um livro, mas dois poetas: Ricardo Aleixo e Ana Martins Marques.

16 - Espaço aberto para sugestões de perguntas e palavras finais.

Agradeço a oportunidade. As questões sempre nos fazem pensar um pouco sobre nossa trajetória, e as suas me levaram a refletir sobre a literatura de forma ampliada, pois tive de pensar em autores que me marcaram, inclusive na cena atual. Como sugestão: perguntar sobre os novos projetos.

 


Comentários

  1. Bravo, Alexandre. É isso: dormir, acordar, respirar e dar sempre uma boa espiadinha nos arredores.

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    1. É por aí, Raul. Despentear e ficar nervoso só com as coisas do amor.

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  2. Admirável integridade pessoal e literária, Alexandre. Saber da humana e transitória condição. Alegria por partilhar, Alexandre Brandão.

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    1. Nilma, querida, obrigado por estar sempre tão perto, às vezes indicando caminhos, noutras abrindo juntos, às cegas.

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  3. Gostei das suas reflexões e prestei atenção nos seus “preferidos” da literatura. O que você escreve reflete sua densidade e humor.

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    1. Obrigado, Maria Helena. Essas entrevistas sempre são boas por fazer com que a gente reflita um pouco sobre nossa trajetória.

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