OUTROS TEMPOS
Eu sou o observador.
Vocês não me conhecem, mas eu conheço vocês.
Conheço todos vocês.
Sei a hora que saem.
Sei a hora que chegam.
Sei a hora que acordam.
Sei a hora que dormem.
Como disse: eu sou o observador.
Vejo vocês no Instagram.
Vejo vocês quando estão dormindo.
Vejo vocês quando estão acordados.
Eu sou o observador.
Sei o que vocês estão pensando.
Sei o que vocês estão digitando.
Eu sou o observador.
Eu sou um observador atento.
Um panopticon universal.
Eu sou o observador.
Agora nesse exato momento a poeta está nos braços de sua amante.
Seu marido atarefado com as constantes viagens que empreende ao visitar clientes de sua multinacional não tem tempo para a poeta.
Sua amante, uma ativista do feminismo, está também nesse exato momento em que a poeta está deitada nos seus braços elaborando um roteiro para a live sobre as mulheres traídas e mutiladas pelos homens.
Agora também nesse exato momento a poeta pensa em escrever um livro sobre a fidelidade das mulheres feministas aos seus maridos que trabalham numa multinacional e viajam o ano inteiro.
Agora observo o post de uma dona de casa casada que hoje é pudica, mas que tem um passado que a envergonha.
Quando jovem costumava sair com todos os meninos de sua rua e de sua escola.
Hoje, essa senhora muito pudica quer que suas netas façam a faculdade que ela não fez.
Que não sejam umas meninas assanhadas como ela foi.
Por isso, ela reza todo dia e pede a Deus que suas netas não sigam os seus passos.
Mas as meninas como essa vovó são também muito assanhadas.
Usam cropped mostrando todos os seios.
Usam um tipo de short que mostra partes das nádegas, fumam narguiles, pods descartáveis, maconha e bebem um tipo de bebida que é uma mistura de todas as bebidas.
A vovó fica muito chateada com as suas netas e vive dizendo para elas que no tempo dela as coisas não eram assim e que tem saudade do tempo da escola, embora tenha cursado até o terceiro ano primário que tem saudade do tempo do respeito que tinha pelos seus pais, embora tenha perdido a virgindade com treze anos de idade com o vizinho da casa de cima à sua quando seus pais se distraíram com ela.
O malfeitor que era como dissemos vizinho da casa de cima era um senhor muito educado e respeitoso casado com a melhor amiga da vovó que tem em seu coração muita raiva e muito ressentimento.
Mas como diz a nossa vovó pudica: "eram outros tempos aqueles!"
Outros tempos!
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