JARDEL DIAS CAVALCANTI


1 - Fale de você: onde nasceu? qual formação? onde vive? o que faz?
Nasci em Dom Silvério, mas desde a primeira infância, sou de Mariana, pequena cidade histórica do interior de Minas Gerais.  Sou formado em História na graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado em História da Arte. Vivo em Londrina, onde sou professor do curso de Artes Visuais na Universidade Estadual de Londrina (UEL) e tenho uma "editora" alternativa de plaquetes, a Galileu Edições.

2 - Quais são os seus escritores preferidos? Por quê?
Proust, por causa de sua investigação profunda da alma humana em sua variedade multicolorida e na sua destruição pelo tempo; Beckett por causa do enxugamento da linguagem até o silêncio; e Kafka, por causa do absurdo da existência que ele revela de forma engraçada.

3 - Como é o seu cotidiano?
Acordo todos os dias às 6 da manhã, leio um pouco na cama, depois tomo café, em seguida vou para o computador resolver coisas urgentes, dar aulas quando as tenho, depois ler ou escrever até a hora do almoço (quando não tenho aula); no período da tarde, ou volto ao trabalho de escrever, ou preparo uma aula ou vejo um filme; à noite gosto de jantar e ver um filme ou terminar um livro que estou lendo.

4 - Quantos livros publicou?
Um sobre anarquismo, três sobre artes plásticas, dois de poesia, capítulos de livros.

5 - Quais foram as suas alegrias literárias?
Ter escrito um poema que eu achei que valia alguma coisa.

6- Quais foram as suas frustrações literárias?
Ter escrito um romance, de características filosóficas, e descobrir que era uma enorme porcaria e ter que apagá-lo no computador. Só o lixo o receberia bem, creio eu.

7 - Qual é o seu objetivo na literatura?
Escrever algo tão inútil (mas esteticamente bom) que não sirva a causa nenhuma.

8 - Você julga a escrita superior à oralidade? Por quê?
Sim, pode ser, porque você pode refazer, retrabalhar, reinventar uma língua a partir da escrita e fixá-la para gerações futuras.

9 - Como você se organiza para escrever?
Tudo acontece primeiro na minha mente, onde vou organizando frases, parágrafos, versos, ideias e depois quando sento para escrever tudo está lá (ou quase tudo, se não for artigo universitário, que já é outra praia).

10 - Você quer ser reconhecido? Por quê?
Matei meu ego na adolescência lendo a filosofia zen budista e tomando chá de cogumelo. A maior parte do que escrevo fica na gaveta, pois diz respeito mais a uma realização pessoal solitária do que social, isto é, direcionada para o sistema das artes. Claro que um trabalho bom merece ser reconhecido, mas meu nome não me importa. Sinto até vontade de trocar de nome ao assinar trabalhos pessoais. Inclusive, fico constrangido com a vaidade alheia. O que importa é a circulação de boas obras de arte e de boas ideias. Admiro artistas, não pelo que são (em geral são chatérrimos), mas pela obra que construíram.

11 - O que é um poeta ou um escritor?
É antes de tudo alguém insatisfeito com a própria existência e com a existência em geral. Mais ainda, descontente com a linguagem tradicional ou prosaica do mundo. Por isso seu trabalho é renovar a forma de comunicação através da linguagem plástica, musical, poética. No fundo, todo artista gostaria de ser um ditador, para poder reconstruir o mundo à sua imagem e semelhança. Alguns dizem que se não fossem artistas, seriam, inevitavelmente, assassinos.

12 - Todo escritor é vaidoso?
Eu não sou, mas não conheço um que não seja.

13 - Como você lida com o fracasso?
Estou justamente lendo um livro agora que se chama "As virtudes do fracasso", de Charles Pépin. O fracasso gera insatisfação e a insatisfação nos faz mudar o rumo das coisas, diz o autor. Me considero um verdadeiro fracassado, no sentido geral: não sou o professor que gostaria de ser, não sou o poeta que gostaria de ser, não sou o historiador que gostaria de ser, não falo bem nem uma das línguas que adoraria dominar profundamente (inglês, francês, alemão, italiano, tupi-guarani), não trepei com as mulheres que desejei, não ganhei o dinheiro preciso para viajar o mundo, não li metade de minha biblioteca de 8 mil volumes ainda, não sou o pai que gostaria de ser, não queria ter causado sofrimento às pessoas que fiz sofrer por alguma razão e o pior de todos os fracassos, nasci homem, quando gostaria de ter nascido mulher (o que nunca me fez gay, mas sou simpatizante fervoroso do universo gay) etc.

14 - Como você lida com o sucesso?
Não sei o que é isso, nunca tive. Não me esforço para ter "sucesso", mas para fazer o que dou conta de fazer.

15 - Qual é o autor contemporâneo que, de fato, você admira? Seja sincero (a).
Embora não tenha a dimensão de um Thomas Bernhardt, o escritor que me pegou nos últimos tempos foi o Michel Houellebecq, talvez por ser politicamente incorreto. Cheguei a traduzir alguns poemas dele e publiquei como plaquete na Galileu Edições.

16 - Espaço aberto para sugestões de perguntas e palavras finais.
Relaxem, meros animais humanos, todos os impérios foram ao chão. Só se apressem em derrubar esse que está aí, já que sabemos que não deu nem vai dar em boa coisa.

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