Os Granizos Dos Deuses
Políticos e artistas estupefatam-se 
diante de uma escultura, 
um quadro ou um belo livro de sonetos.

Nos vernissages 
conversam e detalham 
todos os aspectos eloquentes 
do pensamento inserido nas obras de arte.

Esmiúçam as mais recônditas ideias.

Falam da laicização.

Falam do profano.

Argumentam sobre a estilística 
contemporânea.

Engendram loquacidades 
não intencionadas 
pelo artesão ou poeta.

Vão do chinfrim ao magnificente.

Atomizam-se ante a deformidade 
das linhas de um cubista.

Dobram-se ao verso escandido irregularmente .

Projetam a dissidência de um movimento.

As taças de champanha transbordam 
nas mãos dos honoris causa do pensamento.

Resgatam Weber e Durkheim 
ou pedem socorro a Mauss.

Seus próprios pensamentos 
não se alicerçam 
sem um fundamento 
embasado numa dialética sufragada pela erudição.

Alguém tem que falar por nós, Proserpina.

E eu lhe falo: necessitamos de mitos.

Necessitamos de ter a corroboração 
de nosso pensamento 
para que possamos 
caminhar livres 
pelas obscuras 
sendas do irreal.

Para que possamos 
suportar esse mundo de 
semiverdades e de aparências 
que nos circunda.

Esse mundo da não verossimilhança.

Fora dos vernissages, 
Proserpina, 
nem tudo nos é permitido.

Interditos são certos 
achaques ou 
comportamentos.

Por isso, Proserpina, eu lhe dou 
esse mundo de hades.

É nele que poderemos 
transitar livremente... 

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